A condenação em primeira instância do ex-vereador de Porto Alegre e atual presidente do Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores Municipais de Canoas (Canoasprev), Valter Nagelstein, pelo crime de racismo pode ser considerado um passo importante no meio jurídico para mudança de paradigmas na compreensão de como a discriminação racial se manifesta e seus perversos efeitos em toda a sociedade. A ação se refere às declarações feitas pelo então vereador pelo PSD na capital gaúcha após a apuração dos resultados das eleições de 2020, em que cinco vereadores negros foram eleitos por partidos de esquerda.
A sentença do juiz Sidinei Jose Brzuska, da 3ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, assinada no último dia 4 de março, considerou que a “enumeração de negros em um contexto de expressões pejorativas” incorre em conduta tipificada como preconceito de raça ou de cor e que, portanto, merecia sanção penal. A decisão é inédita, pelo menos no Rio Grande do Sul, em se tratando da condenação de alguém do meio político.
Para o mestrando em Direito e membro da Coordenação Nacional do Movimento Negro Unificado (MNU), Gleidson Renato Martins Dias, que também é autor da representação junto ao Ministério Público que deu origem à ação penal, a decisão fortalece a luta contra o racismo como um todo e também aquele ocorrido de forma institucional. “Acho que é um grande avanço. A gente supera a hermenêutica jurídica da branquitude, aquele posicionamento comum entre os juristas que acaba fragilizando os avanços de combate ao racismo”, considera Dias.
A partir desse entendimento, podemos dizer ainda que, de certa forma, cosolida-se o conceito de racismo no Brasil, que é uma antiga luta do movimento negro, de intelectuais e de professores que se debruçam sobre a questão racial. “Isso é uma disputa muito grande, porque as pessoas acabam confundindo o que significa o racismo e acabam relativizando. É o chamado racismo recreativo, cunhado pelo professor Adilson Moreira”, explica Dias.
Em outras palavras, não precisa necessariamente haver uma declaração explícita a respeito da cor da pele de uma pessoa para incorrer em racismo. De acordo com Dias, no caso da ação contra Nagelstein, o racismo é compreendido também na acepção apresentada pelo então vereador, a qual ele delega um espaço somente para as pessoas brancas, que o avanço de pessoas negras na universidade é fruto da esquerda e que isso resultou deles irem para o parlamento, que seria lugar de pessoas brancas. “A fala dele induz que tanto a universidade quanto o parlamento não é lugar de pessoas negras”, caracteriza o representante do movimento negro.
Dias comemora ainda a união da sociedade civil em torno do tema. Além do MNU, a representação teve a participação de mais de 40 entidades de diversas áreas da sociedade civil organizada. “Eu digo que é uma vitória da sociedade gaúcha, enfim, a sociedade já sabia que se tratava de um crime de racismo”, completa.
Embora ainda cabe recurso da decisão, Dias confia que a sentença deve ser mantida porque no caso da instância jurídica máxima, o Supremo Tribunal Federal, tem se manifestado progressistamente no entendimento das questões raciais, como no caso da recente equiparação de injúria racial ao crime de racismo. “Em alguma medida essa visão progressista do STF deve influenciar a visão dos procuradores estaduais aqui no Rio Grande do Sul. Nós vamos continuar mobilizados, conversaremos com os desembargadores, traremos novamente a sociedade civil organizada para manutenção e acredito sim que nós temos mais chance de manter a condenação do que ele reverter”, finaliza.
Bancada negra da Câmara também comemora
Vereadoras da bancada negra da Câmara de Porto Alegre também celebraram a decisão e garantem que seguirão na luta e atentas para que a sentença seja mantida.
Para a vereadora Laura Sito (PT), embora ainda haja possibilidade de recurso da sentença, a decisão é um marco muito importante e reforça a condenação do crime de racismo de qualquer tipo. “Isso demonstra que todas as formas de racismo, mesmo o racismo recreativo, aquele da mesa de bar, do grupo de whatsapp com os amigos, aquele do ambiente familiar, quaisquer tipos de racismo não podem ser tolerados, ainda mais de alguém que visa ter uma representação pública. Portanto, o Valter ser o primeiro político condenado, não por injúria racial, mas por racismo, é um marco da luta antirracista do Brasil. Por isso que eu e toda a bancada negra estamos muito contentes com esta primeira decisão. Nos empenhamos muito no processo e esperamos de fato que ele não tenha a situação revertida nas demais instâncias”, assevera Laura. De acordo com ela, esse é um debate que, inclusive, cabe não só do ponto de vista judicial como também político.
A vereadora Daiana Santos (PCdoB) espera ainda que essa condenação sirva de exemplo para que atitudes e manifestações racistas não voltem acontecer seja em qualquer instância da sociedade, sobretudo institucionais ou de poder. “É uma grande vitória para todos nós negros e negras, porque foi de uma forma muito absurda que ele proferiu inverdades contra o povo preto e de forma a desqualificar toda a nossa trajetória e todo esse povo. Eu fico muito feliz com essa vitória e acho que definitivamente nós temos que celebrar, mas seguimos atentos para que essa ação não seja distorcida e que seja mantida essa condenação exemplar”, declarou Daiana.
Outro lado
Em nota à imprensa, o ex-vereador afirma que vai recorrer da decisão. Ele classifica o processo como absurdo e diz que a sentença é um exemplo do que tem denunciado, de que o judiciário foi tomado “por ideologia”. “Sou neto de uma negra e de um judeu fugido da guerra, circunstâncias que jamais omiti e que trago como partes de mim, com orgulho, como mostra um poema que fiz aos meus avós em 2009 – e que foi publicado nas minhas redes sociais então, e trazido a esse absurdo processo. Recebo a sentença com profunda tristeza, porque mostra exatamente o que tenho denunciado, o judiciário e a educação tomados por ideologia. Isto sim põe a democracia em risco, porque criminalizam a nossa forma de pensar e impõem aos nossos filhos o que é certo ou errado segundo a visão de militantes. Recorrerei junto com meus advogados e sigo acreditando na justiça imparcial, aquela que aprendi a ver o meu pai, como magistrado, perseguir e aplicar”, diz a nota de Nagelstein.
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