Este ano, o País atingiu a marca de 125 milhões que não têm o que comer todos os dias e 33 milhões passando fome. Para Tereza Campello, governo é culpado
O Brasil atingiu este ano a marca de 125 milhões de pessoas, mais da metade da população brasileira (212,6 mi), que não têm o que comer nas três refeições diárias necessárias, e 33,1 milhões passando fome todos os dias. É o maior número de brasileiros com fome desde os anos 1990, quando órgãos como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre outros, começaram a pesquisar a insegurança alimentar.
Os dados são de estudo realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), com execução em campo do Instituto Vox Populi. A pesquisa revela o aumento da fome de novembro de 2021 a abril de 2022.
De acordo com o levantamento, o número de pessoas passando (33,1 milhões) aumentou 73,2% em relação à pesquisa feita em 1990, quando eram 9%, ou 19,1 milhões de pessoas.
Na avaliação de Tereza Campello, ex-ministra de Combate à Fome, no governo de Dilma Rousseff (PT), a gravidade da situação é ainda maior ao observar o resultado da 2º Inquérito Nacional Sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 (Vigisan), da Penssan, que mostra que a fome se espalhou pelo país inteiro, não sendo mais apenas um problema das regiões Norte e Nordeste, e sim de todo o Brasil.
“O que mais me assusta é a fome atingindo o Estado de São Paulo. Enquanto no Nordeste como um todo tem 12 milhões e 100 mil pessoas em situação de fome, somente o estado de São Paulo tem 6,8 milhões, mais da metade de toda a região Nordeste”, diz Tereza Campello.
Confira os dados da fome por região e estados aqui
“Podemos afirmar com certeza absoluta de que é a fome com esta característica nacionalizada nós não tínhamos vivido, não é fato conhecido no Brasil. O presidente Jair Bolsonaro conseguiu nacionalizar a fome”, Tereza Campello.
Para a ex-ministra, a responsabilidade pelo alastramento da fome em todo o território nacional é do atual presidente por ter destruído, não apenas uma política, mas um conjunto de políticas públicas e, pior deixar que a fome deixasse de ser prioridade do Estado brasileiro.
“Lula assumiu em 2002, dizendo que a fome era uma prioridade e o governo Bolsonaro faz o oposto. Para ele, não existe fome no Brasil, ele questiona os números e ao invés de incorporar o problema e dizer que vai enfrentá-lo, nega a sua existência”, afirma Tereza Campello, se referindo as afirmações do atual presidente da República, que em entrevista no dia 26 de agosto deste ano, à rádio Jovem Pan e a um podcast de fisiculturismo, negou que a fome existisse no Brasil.
A destruição de políticas públicas
Segundo a ex-ministra, o conjunto de políticas que garantiram aumento de renda para a população, como a valorização do salário mínimo criada nos governos petistas e destruídas por Bolsonaro, são em grande parte as responsáveis pela atual situação de fome no Brasil.
“Com o salário mínimo congelado e os preços dos alimentos aumentando, ao contrário do que aconteceu com Lula e Dilma onde os preços estavam estabilizados e o aumento do salário mínimo crescia acima da inflação, a perda de renda impede que as pessoas se alimentem adequadamente”, diz. Nos governos do PT, o salário mínimo subiu quase 75% acima da inflação.
Faltam trabalho e renda
Outros pontos considerados por ela, como fatores determinantes para o aumento da fome no Brasil, é a falta de geração de empregos formais, e de incentivo à formalização de trabalhadores com carteira assinada.
“A população desempregada é muito alta e quem está trabalhando está ocupada, na sua maioria, em trabalhos informais, com uma renda comprimida. Então você tem uma renda da classe trabalhadora reduzida e quem está trabalhando, é de forma precária, com menores salários, e trabalhando menos horas do que gostaria, ou do que precisa”.
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Outros dados da Rede PENSSAN, prossegue Campello, mostram que o trabalhador na informalidade corre três vezes mais risco de vivenciar a fome mais intensamente do que o trabalhador com carteira assinada.
“Isso demonstra que, quem está passando fome não é só o desempregado, é também quem está trabalhando, quebrando o mito de que a pessoa que está passando fome é porque está desempregada. Hoje passa fome também que está empregado nesses cargos de ocupações precárias e de renda insuficientes para garantir que as famílias vivam com dignidade”, ressalta.
“O desmonte dessa relação trabalhista no Brasil com a reforma foi um dos grandes caminhos abertos que destruiu a agenda de combate à pobreza e à fome”, afirma Tereza Campello.
A ex-ministra cita ainda a destruição feita pelo atual governo da agricultura familiar, que é fortíssima no Brasil e sempre foi muito importante, não só para reduzir a pobreza e a fome no campo, como também para gerar alimentos de verdade, mas o que se viu foi o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário e as políticas voltadas para o campo.
Segundo Campello, o grande erro do governo Bolsonaro foi colocar a agricultura familiar subordinada à agenda do agronegócio; acabar com a assistência técnica, com a cisternas, com o programa de aquisição de alimentos.
“A lista é enorme, destruíram os órgãos de controle, de participação social e o conjunto das estruturas do Estado que garantiram que essas políticas pudessem ter esse olhar da sociedade, eles acabaram com tudo”, critica.
Como combater a fome
Segundo a ex-ministra do Combate à Fome, o que vai permitir o enfrentamento a essa situação é um conjunto de políticas públicas que garantam renda para que essa população possa produzir alimentos.
O Norte e o Nordeste têm condições de produzir, e produz. O que não dá é a gente ficar produzindo só de milho. Nós temos que produzir comida de verdade: arroz, feijão, frutas e legumes. O problema da falta de comida no Brasil da fome, não é falta de alimentos e do Nordeste também não é esse o problema. É que esses alimentos são distribuídos de forma desigual para as pessoas que não têm renda”, afirma Campello.
Ela também ressalta a importância de programas como o Luz para Todos, a distribuição de sementes de boa qualidade e assistência técnica, o crédito rural para enfrentar períodos de seca ou de excesso de chuvas, que ajudaram os agricultores em todo o Brasil.
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