O Senado concluiu, nessa quinta-feira (2/12), a votação da Proposta de Emenda à Constituição nº 23/ 2021 (PEC 23/21), que trata da suspensão do pagamento, em 2022, dos precatórios de quem já tem ganho de causa na Justiça para recebe-los e dos recursos financeiros para o programa temporário Auxílio Brasil.
A PEC 23 chegou ao Senado Federal com muitos problemas e, após muitas e intensas reuniões, as bancadas de oposição conseguiram mudanças importantes no texto que chegou da Câmara dos Deputados. Essas mudanças, segundo o advogado Marcos Rogério, assessor jurídico no Senado Federal, aliviam o calote nos precatórios, sem, contudo, resolver, totalmente, o problema.
O texto que veio da Câmara estabelece que o limite para gastos com precatórios, em 2022, será de R$ 44 bilhões. A PEC previa que há uma fila para atendimento dos precatórios. As RPV, por exemplo, que representam R$ 20 bilhões, têm de ser pagas antes dos outros. Os precatórios superalimentares, que representam R$ 12 bilhões, têm de ser pagos em sequência. Os precatórios alimentares, que também têm de ser pagos com prioridade e na sequência, representam R$ 8 bilhões.
Antes ainda dos precatórios alimentares, tinha os precatórios do Fundef, que representam cerca de R$ 7 bilhões. Do jeito que veio da Câmara dos Deputados, a PEC dos precatórios significaria, já em 2022, um calote nos precatórios alimentares na ordem de R$ 3 bilhões. Ou seja, se o governo pagasse todas as prioridades anteriores, o volume de recursos envolvido atingiria os R$ 44 bi e não seriam suficientes para pagar os precatórios alimentares.
As mudanças que conseguimos fazer no Senado fizeram com que os precatórios decorrentes do Fundef ficassem fora do subteto de precatórios e fora do Teto de Gastos. Isso significa que, dentro desses R$ 44 bi, não estão contabilizados os precatórios do Fundef. Isso permitiu que, em 2022, todos os precatórios alimentares fossem assegurados.
Dos demais precatórios, que não são alimentares e somam R$ 26 bilhões, em 2022 será possível pagar cerca de R$ 4 bilhões. Ou seja, a PEC 23/21 continua sendo a PEC do calote nos precatórios e, em 2022, o calote será concentrado nos precatórios não alimentares e será da ordem de R$ 22 bilhões.
O problema é que esses R$ 22 bi não pagos em 2022 poderão figurar como item um da fila de pagamentos a partir de 2023. O governo Bolsonaro nega e diz que a lista de prioridades para 2023 se restabelece e o teto deverá ficar me cerca de R$ 48 bi. Assim, em 2023, terá de ser pagas, primeiramente, as RPV, e, segundo a ordem de prioridade, vêm os precatórios superprioritários, os alimentares, os de 2022 que não haviam sido pagos e, depois, os precatórios não alimentares de 2023.
Essa é a interpretação do governo Bolsonaro e não é pacífica. “Nós, por exemplo, temos a leitura de que, em 2023, o governo teria de pagar os precatórios remanescentes de 2022 e, se em 2023 o governo tiver de pagar os precatórios de 2022, já em 2023 haverá calote nos precatórios alimentares. É por isso que o texto da PEC avançou muito no Senado, porque resolve o problema de 2022, porém, a partir de 2023 ela precisa ser equacionada”, afirma o advogado.
Segundo ele, de todo modo, da forma que foi aprovada no Senado, a PEC 23/21 representa uma bola de neve porque os precatórios de 2022 ficam para 2023 e os recursos financeiros são insuficientes para pagar os dos dois anos junto, o que joga pagamentos para 2024 e assim sucessivamente.
“Mas essa melhoria que ocorreu com a retirada do Fundef do subteto dos precatórios foi muito importante para permitir o pagamento dos alimentares em 2022. Em 2023 será um novo governo e, provavelmente, esse debate será reaberto”, comenta.
Senado atenua calote, mas o golpe prossegue até 2026
O texto da PEC 23/21 aprovado na Câmara estabelecia que o calote duraria até 2036. No Senado, ficou limitado até 2026. Até 2026 haverá a política do calote nos precatórios. A partir de 2027 restabelece o regime anterior sem que esse calote poderia acontecer.
Bancada do PT garante caráter permanente ao Auxílio Brasil
O texto da Câmara não assegurava o direito a um programa permanente de renda para a população mais pobre. Essa talvez tenha sido uma das principais conquistas do Senado. Graças a uma emenda do PT, encampada e melhorada por todos os outros partidos, o direito à renda permanente passou a figurar como uns dos direitos sociais inscritos no artigo 6º da Constituição.
Senadores fecham espaço fiscal e freiam uso pessoal do dinheiro público
Além disso, uma preocupação política que existia era a de que o texto aprovado na Câmara deixava os espaços fiscais muito abertos para que o governo federal utilizasse os recursos financeiros do jeito que ele quisesse. No Senado, os recursos foram carimbados para esse espaço fiscal.
Ou seja, o que sobrar de dinheiro do calote nos precatórios deverá ser utilizado, exclusivamente, em programas de transferência de renda e em programas ligados à seguridade social, tais como a recomposição dos benefícios, do INSS, da assistência social e também para o seguro desemprego.
Em resumo, o texto aprovado no Senado melhora, profundamente, o texto que veio da Câmara dos Deputados, ainda que não resolva integralmente o problema dos precatórios. O texto do Senado joga o problema para o ano 2023 e, a partir desse ano, a sociedade terá de fazer um novo debate.
Para melhorar esse texto, o Senado contou com a ajuda fundamental do Coletivo Nacional de Advogados Públicos, de todas as entidades sindicais e, sobretudo, do IBDP. “Desde o primeiro momento, o IBDP foi um instituto parceiro e essencial para que a gente conseguisse construir esses avanços”, finalizou.
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