Centrão, bloco que reúne um completo aglomerado de siglas partidárias dentro da Câmara dos Deputados, transformou-se, ao longo de vários governos, num poder paralelo dentro do Poder Legislativo. Desde a Constituinte de 1987, um bloco de partidos, de perfis ideológicos de direita e centro-direita ou sem ideologia alguma, se uniu com um único objetivo: manter uma ponte que os levem sem intermediário ao Palácio do Planalto e retirar do governo vantagens em cargos, privilégios e dinheiro de emendas que resultem em votos nas bases eleitorais de cada parlamentar. O Brasil, portanto, vive a lógica do presidencialismo de aluguel, desprovido de republicanismo.
O Centrão é um modelo estilo coração de mãe. Cabe qualquer um que se identifique com as práticas do clientelismo eleitoral, sustentada na esperteza e no dinheiro federal. Portanto, não se trata necessariamente de um grupo de espectro político-ideológico centrista, mas de um agrupamento de siglas de orientação conservadora. Hoje o Centrão acomoda quase a metade dos 513 deputados na Câmara, e dos 81 senadores. Nem sendo chamados pejorativamente de baixo-clero, os incomodam como bullyng. Afinal, o que importa é o assédio do Executivo na hora de decidir matérias complicadas, como os 68 pedidos de impeachment contra Jair Bolsonaro, que descansam na gaveta da mesa diretora da Câmara.
É com o Centrão que todos os presidentes da República, desde José Sarney até Jair Bolsonaro, se arrumam tanto para aprovar o que interessa ao Planalto, quanto para desapertar o pescoço nas horas difíceis. Quem não se lembra do espetáculo deprimente da sessão em que a Câmara aceitou o impeachment de Dilma Rousseff em 2016? O mesmo Centrão que apoiou a ‘presidenta’ foi o mesmo que a despejou do Planalto. Tudo regrado pelos interesses pessoais e o fisiologismo. E assim, cada presidente tem o centrão que merece. Passa mandato parlamentar, substituem-se lideranças, comando das duas casas do Congresso, e o Centrão lá está lá dando as cartas. Todo pragmático, jeitoso e voraz pelo poder.
A eleição do deputado Artur Lira (PP) e do senador Rodrigo Pacheco (DEM) fez renascer o DNA da velha Arena que sustentou a ditadura de 1964, por 21 anos. Assim Também é o PSL que elegeu Jair Bolsonaro em 2018. Pertence a mesma árvore genealógica do poder autoritário, que permeia a resiliência do pensamento brasileiro, bafejado pelas elites de antes e de depois de 64. Serve de alertas para quem acredita que as instituições estão funcionando plenamente e que farão a contenção de rupturas antidemocráticas que devem emergir de dentro para fora nos próximos meses. O Centrão tem a imagem do rabo que abana o cachorro, ou a eterna volta do que nunca se foi.