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Nostalgia do poder anglo-americano | Um novo mundo de desordem monetária à espreita  

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Martin Wolf, famoso comentarista econômico do Financial Times, parece que ainda não tomou pé sobre o que está rolando depois que Putin disse que somente negociará mercadorias russas mediante pagamento em rublo russo; tomou essa decisão como alternativa para fugir das sanções econômicas dos Estados Unidos contra a Rússia, obrigando todos os aliados a seguirem essa orientação; mas, eis que de repente, os alemães e os franceses passam a ser alertados pelos seus presidentes, respectivamente, Olaf Scholz e Emmanuel Macron, que eles, de agora em diante, precisam fazer, obrigatoriamente, poupança não mais em dólar ou em euros, mas em rublo, para comprar gás e petróleo russos, dos quais dependem para sobreviver; outra moeda, Putin não vai aceitar; essa decisão, essencialmente, de economia política, cria novo conceito de política monetária, que passa ao largo da hegemonia do dólar; não basta ter dólar para comprar gás e petróleo russos; faz-se necessário comprar rublo no mercado de moedas, para negociar com Putin; a moeda russa, que não tinha curso internacional obrigatório até agora, passa a ser vista como equivalente relativo global indispensável; como o Brasil comprará fertilizantes da Rússia se não tiver poupança em rublo disponível; se não tiver tem que converter real em rublo ou dólar em rublo etc; as mercadorias russas, diante dessa exigência de Putin, viram, automaticamente, moeda, valor monetário real, enquanto o dólar, por exemplo, passa a ser visto como poder fictício, visto que não tem lastro real; o padrão-dólar sofre um baque; a Rússia fixa novo padrão monetário, para vender sua mercadoria; não adianta dispor da moeda mais poderosa, como, ainda, é considerada a moeda de Tio Sam; se ela não for convertida em rublo, para Putin não serve, pois não será trocada pela mercadoria russa, que se sobrevaloriza; e agora? Macron e Scholz, líderes da França e da Alemanha, humildemente, já lembram franceses e alemães que precisarão enfrentar a nova realidade posta pela guerra; a Europa é jogada de chofre numa discussão para a qual não estava preparada; o mercado financeiro global passa a ser obrigado a colocar o rublo como moeda de troca obrigatória, embora sua expressão econômica não tenha, por exemplo, correspondência equivalente em relação à poderosa economia americana; a importância surpreendente do rublo é fruto, naturalmente, da força militar, bélica e espacial, somada, naturalmente, às suas reservas primárias, sem as quais o mundo, como está estruturado, no capitalismo, não sobrevive; a necessidade de adaptação do mercado financeiro à nova realidade geopolítica que espelha a vitória política e militar de Putin sobre a Ucrania, armada pelos Estados Unidos e Otan, torna-se necessidade premente; os europeus passam a questionar se o fundamental é sustentar relação com a Rússia, sem a qual não se sustentam em pé, ou com a Otan, no âmbito da qual estão submissos aos Estados Unidos; o interesse social que reclama objetividades contundentes precisa ser atendido e priorizado pelos líderes políticos, pois, do contrário, perdem eleições; como nem a Europa nem os Estados Unidos têm capacidade de reverter pela força a decisão monetária de Putin, a Russia se torna mais indispensável para a Europa do que os próprios Estados Unidos; a movimentação desorientada de Macron e Scholtz diante da nova realidade imposta por Moscou, por sua vez, fortalecida pela aliança com a China, é a nova base real do sistema monetário que tende a impor nova divisão internacional do trabalho. Martin Wolf, cercado da prepotência e da arrogância de falsa certeza de que o dólar – aliado da libra – segue dando as cartas, graças ao tamanho da economia de Tio Sam, ouve, apenas, o galo cantar a nova realidade, mas não está, parece, sabendo dos efeitos devastadores dos últimos acontecimentos, seja para o dólar, seja para libra ou para o euro. Ou entao finge não saber.

 


 

Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics.

Financial Times

Um novo mundo de desordem monetária à espreita

Yuan chinês pode ser um desafio para o dólar americano, mas não vai substituí-lo

 

No final de janeiro, a Rússia detinha reservas cambiais no valor de US$ 469 bilhões. Esse acúmulo foi causado pela prudência ensinada por sua moratória de 1998 e, como Vladimir Putin esperava, também garantia sua independência financeira. Mas, quando ele começou sua “operação militar especial” na Ucrânia, soube que mais da metade de suas reservas estavam congeladas. As moedas de seus inimigos deixaram de ser dinheiro vivo. Essa ação não é significativa apenas para a Rússia. Uma desmonetização direcionada das moedas mais globalizadas tem grandes implicações.

 

O dinheiro é um bem público. Um dinheiro global —um com que as pessoas contem para suas transações internacionais e decisões de investimento— é um bem público global. Mas os provedores desse bem público são governos nacionais. Mesmo sob o antigo padrão ouro, era assim. Em nossa era de moeda fiduciária (feita pelo governo), desde 1971 esse foi mais obviamente o caso. No terceiro trimestre de 2021, 59% das reservas globais em moeda estrangeira eram denominadas em dólar, outros 20% em euros, 6% em ienes e 5% em libras esterlinas. O yuan da China ainda constituía menos de 3% das reservas mundiais. Hoje os dinheiros globais são emitidos pelos Estados Unidos e seus aliados, incluindo os pequenos.

 

Isso não é resultado de um complô. Dinheiros úteis são aqueles de economias abertas com mercados financeiros líquidos, estabilidade monetária e estado de direito. Mas a “armorização” dessas moedas e dos sistemas financeiros que as controlam mina essas propriedades para qualquer detentor que tema ser visado. As sanções contra o banco central da Rússia são um choque. “Quem será o próximo?”, perguntam os governos. O que isso significa para nossa soberania?

Pode-se objetar contra os atos do Ocidente sobre bases estritamente econômicas: a armorização das moedas vai fragmentar a economia mundial e torná-la menos eficiente. Isso é verdade, alguém poderia responder, mas cada vez mais irrelevante em um mundo de severas tensões internacionais. Sim, é mais uma força para a desglobalização, mas muitos vão perguntar: e daí?

 

 

Uma objeção mais preocupante para os políticos ocidentais é que usar essas armas pode prejudicá-los. O resto do mundo não correrá para encontrar meios de transacionar e armazenar valor que contornem as moedas e os mercados financeiros dos EUA e seus aliados? Não é isso o que a China está tentando fazer agora? É.

 

Em princípio, poderíamos imaginar quatro substituições para as moedas nacionais globalizadas de hoje: moedas privadas (como o bitcoin); dinheiro em commodities (como o ouro); uma moeda fiduciária global (como os direitos especiais de saque do FMI); ou outra moeda nacional, mais obviamente a chinesa. A primeira é inconcebível: o valor de mercado de todas as criptomoedas hoje é de US$ 2 trilhões, apenas 16% das reservas cambiais do mundo, enquanto as transações diretamente em criptomoeda são extremamente complicadas. O ouro pode ser um ativo de reserva, mas é impossível para realizar transações. Também não há possibilidade de se concordar sobre uma moeda global de peso suficiente mesmo para substituir as reservas, quanto menos para ser um veículo de transações globais.

 

 

Isso deixa outra moeda nacional. Um excelente panfleto recente de Graham Allison e colegas, de Harvard, sobre “A grande rivalidade econômica”, conclui que a China já é um concorrente formidável dos Estados Unidos. A história sugere que a moeda de uma economia desse porte, sofisticação e integração se tornaria uma moeda global.

 

Até agora, entretanto, isso não aconteceu, porque o sistema financeiro da China é relativamente subdesenvolvido, sua moeda não é totalmente conversível e o país carece de um verdadeiro estado de direito. A China está muito longe de oferecer o que a libra e o dólar ofereceram em seus dias áureos. Enquanto os detentores de dólares e de outras importantes moedas ocidentais podem temer sanções, eles devem certamente estar cientes do que o governo chinês poderia fazer com eles, se desagradarem a ele. Igualmente importante, o estado chinês sabe que uma moeda internacionalizada exige mercados financeiros abertos, mas isso enfraqueceria radicalmente seu controle sobre a economia e a sociedade chinesas.

 

Essa falta de uma alternativa genuinamente verossímil sugere que o dólar continuará sendo a moeda dominante no mundo. Mas há um argumento contra essa visão complacente, exposto em “Digital Currencies”, um panfleto do Instituto Hoover. Na essência, é que o sistema internacional de pagamentos interbancos (Cips –uma alternativa ao sistema Swift) e a moeda digital (e-CNY) poderão se tornar um sistema de pagamento dominante e moeda veículo, respectivamente, para o comércio entre a China e seus muitos parceiros comerciais. Em longo prazo, o e-CNY também pode se tornar uma moeda de reserva importante. Além disso, afirma o panfleto, isso daria ao estado chinês conhecimento detalhado das transações de cada entidade em seu sistema. Seria uma fonte de poder adicional.

 

O domínio avassalador dos EUA e seus aliados nas finanças globais, produto de seu porte econômico agregado e mercados financeiros abertos, dá a suas moedas uma posição dominante. Hoje não há alternativa verossímil para a maioria das funções monetárias globais. Hoje a inflação alta provavelmente é uma ameaça maior à confiança no dólar do que sua armorização contra países vilões. Em longo prazo, porém, a China poderá conseguir criar um jardim murado para o uso de sua moeda por seus mais próximos. Mesmo assim, os que desejarem fazer transações com países ocidentais ainda precisarão de moedas ocidentais. O que poderia surgir são dois sistemas monetários –um ocidental e um chinês– operando de maneiras diferentes e se sobrepondo de maneira incômoda.

 

Assim como em outros assuntos, o futuro promete não tanto uma nova ordem global construída ao redor da China, e sim mais desordem. Os historiadores do futuro poderão ver as sanções de hoje como mais um passo nessa jornada.

 

Publicado na Folha de S. Paulo com tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

 

Foto da capa/legenda: Dólar saiu de R$ 5,74 em 21 de dezembro último para R$ 4,74 na sexta-feira – Rick Wilking – 3.nov.2009/Reuters

 

(*) Por César Fonseca é jornalista, atua no programa Tecendo o Amanhã, da TV Comunitária do Rio e edita o site Independência Sul Americana

 




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