Em manifestação à fala do presidente na Assembleia Geral da ONU, no dia 22 de setembro, organizações e movimentos sociais publicam documento em que contestam as afirmações proferidas no discurso. A CPT é uma das signatárias do manifesto que repudia a utilização de espaços públicos para expressar aversão aos povos e comunidades tradicionais do país.
Leia a íntegra do manifesto:
Neste 22 de setembro de 2020, o povo brasileiro consciente da crise política, social, ambiental e econômica que vem se acirrando nos últimos anos no Brasil, sofreu mais um ataque executado pelo presidente Bolsonaro em seu pronunciamento de abertura da 75ª Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque. Um ataque planejado e consciente, que tem a intensão falaciosa de mostrar ao mundo uma realidade que não corresponde ao que ocorre no Brasil, desde sua chegada ao governo. Não convenceu ninguém, exceto, aquela parcela da população brasileira que o segue fielmente.
Uma vez mais, Bolsonaro envergonha brasileiras e brasileiros com uma fala de apenas 14 minutos, mas repleta de inverdades. São omitidos, propositalmente, números, dados e fatos em relação à destruição da Amazônia, como crimes ambientais. O discurso, desta vez em espaço internacional, não difere dos comumente dirigidos aos seus eleitores no Brasil, contudo, nesta ocasião Bolsonaro fez questão de destacar uma série de temas de extrema relevância ao Brasil e os apresentou com todos os requintes falaciosos possíveis, como forma de esconder as inúmeras denúncias contra ações e omissões danosas do seu governo. Um ato não apenas de desespero, de um governante envolvido em várias acusações de irregularidades, mas também uma enorme covardia contra o povo brasileiro, principalmente as populações nativas.
Para tentar esconder a conivência de seu governo com o desmatamento e a grilagem de terras na Amazônia, principalmente em terras públicas, o presidente acusou de forma irresponsável os indígenas e outras populações tradicionais como responsáveis pelas queimadas na Amazônia. A fala reafirma sua negação de direitos e todo seu ódio aos indígenas, quilombolas e demais povos tradicionais. Efetivamente, o atual governo não somente tem feito poucas ações concretas para punir os verdadeiros responsáveis pela maioria dos crimes ambientais ocorridos repetidamente na Amazônia, mas em alguns casos exonerou os servidores públicos de órgãos de fiscalização que autuaram tais criminosos. Um exemplo, “o dia do fogo” no ano passado, em que centenas de incêndios ateados criminalmente, de forma planejada e articulada, ação que teve como principais suspeitos fazendeiros e grileiros daquela região e presença de mais de 20.000 garimpeiros nas terras indígenas yanomâmis no Estado de Roraima.
Toda a intenção do governo Bolsonaro tem sido de desmontar a estrutura – já precária – dos órgãos ambientais, para atender os interesses daqueles que cometem crimes socioambientais contra a Amazônia e seu povo. Bolsonaro chegou a dizer que em seu governo os crimes ambientais “são combatidos com rigor e determinação”, no entanto, são notórias as notícias de que, no primeiro ano de seu mandato, o número de autuações ambientais diminuiu em 34%, considerado o menor índice de autuações nos últimos 24 anos.
Em julho deste ano, a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do Pecma – Ascema Nacional elaborou um manifesto técnico, em que apresentou dados sobre o aumento do desmatamento e queimadas na Amazônia, em decorrência do desmonte das políticas e estruturas de proteção. Na manifestação, a organização recomendou que fossem tomadas medidas urgentes para conter o avanço do desmatamento e das queimadas na Amazônia. Mas, segundo informações recentes da Ascema Nacional, nenhuma das medidas sugeridas pelos servidores foi tomada pelo governo Bolsonaro.
São evidentes as ações organizadas contra as populações amazônicas e sua floresta pelo atual governo, enquanto irresponsavelmente Bolsonaro tenta convencer o mundo de que os responsáveis pelos incêndios foram aqueles que mais defendem a floresta, expondo uma postura covarde e leviana. Uma atitude irresponsável do próprio presidente de criminalização dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Afirmar em seu discurso que seu governo tem se preocupado com os crimes ambientais e que combate de forma séria a pandemia provocada pela Covid-19 no Brasil demonstra o desrespeito para com a população brasileira e uma enorme irresponsabilidade.
Em seus diversos discursos, Bolsonaro banaliza o grave momento de pandemia vivido por brasileiras e brasileiros, e envergonha o Brasil perante o mundo. Esconde os verdadeiros culpados pela destruição ambiental que são seus aliados e apoiadores, os empresários do agronegócio. O que na prática acontece é o desmonte da área socioambiental. Enquanto isso, avança de forma acelerada, o desmonte das políticas socioambientais e a destruição da natureza. Uma vergonha!
Nós, cidadãs e cidadãos brasileiros, em especial as e os amazônidas conscientes, manifestamos nosso repúdio a mais este discurso vergonhoso do representante de nossa nação. Repudiamos um governante que utiliza de espaços públicos para expressar toda sua aversão às populações nativas de seu país e, com a ironia frequente, acusar estes povos de responsáveis pelos danos causados à Amazônia, revelando intensão de “passar a boiada” por meio de suas ações contra a Amazônia. Para nós, o atual governo é indigno de ocupar tal cargo e por isto manifestamos nosso protesto contra seu governo.
Brasília, 24 de setembro de 2020.
Assinam este documento:
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