Nesta segunda parte da entrevista com o jornalista Otávio Costa, recém-eleito por ampla maioria para a presidência da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), ele faz uma análise da situação política atual com um olhar retrospectivo, voltado para a história recente do Brasil. Costa é testemunha ocular dos muitos dos principais eventos históricos do Brasil dos últimos 60 anos e, com esse conhecimento, ele compara a situação do País de hoje com à dos anos finais do século 20.
Provocado pelo jornalista Beto Almeida, presidente do Jornal Brasil Popular, Costa faz um paralelo entre a Operação Lava Jato, o golpe de Estado de 2016 e as tentativas de golpes ocorridas no País nos anos 1950 e 1960. Ele mostra diferenças e semelhanças entre a campanha difamatória articulada para destruir o governo Getúlio Vargas, conhecida como “mar de lama”, e impedi-lo de criar a Petrobrás totalmente nacional, e a Operação Lava Jato, comandada pelo ex-juiz Sérgio Moro, declarado de suspeição pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na condenação do ex-presidente Lula, por denúncias de corrupção. Para o Supremo, Moro agiu com “parcialidade”. Declarado inocente, Lula concorre as eleições deste ano, liderando, até agora, as pesquisas de intenção de votos. O “mar de lama” foi uma campanha de difamação intensa orquestrada contra Vargas e contra a nacionalização do petróleo brasileiro. Uma ação mercenária contra o Brasil que culminou com o golpe civil-militar de 1964.
Na Operação Lava Jato, as elites midiática, empresarial, financeira, agrária, militar, policial, jurídica e estrangeira mergulharam o País em centenas de ações ilegais, inconstitucionais e imorais para aplicar o golpe de Estado de 2016 e entregar, dentre outras riquezas, o pré-sal, recém-descoberto pela Petrobrás, a empresas estrangeiras, notadamente, norte-americanas. Em 1954, o “mar de lama”, que levou Vargas ao suicídio, contou com a participação de militares de alta patente das Forças Armadas, empresários da mais alta elite financeira nacional e da mídia brasileira. Também semelhante ao “mar de lama”, a Operação Lava Jato usou o discurso da corrupção para jogar a população contra os governos democraticamente eleitos e entregar as riquezas nacionais a estrangeiros, com intensa participação e ingerência dos EUA.
No ‘lavajatismo’, atuaram numa campanha ferozmente difamatória para demolir o governo Dilma Rousseff (PT) e impedir o ex-presidente Lula de se candidatar em 2018. O resultado foi o golpe de Estado de 2016 e uma eleição fraudada, que levou um capitão banido do Exército, sem representatividade e subserviente à elite fascista dos EUA, ao comando do Palácio do Planalto. O primeiro passo do governo golpista liderado por Michel Temer, do MDB, e do Congresso Nacional dominado por partidos neofascistas e fundamentalistas do chamado “centrão”, foi aprovar o Projeto de Lei do Senado n° 131, de 2015, do senador José Serra (PSDB-SP), que modificou a Lei nº 12.351, de 22 de dezembro de 2010, para privatizar o pré-sal descoberto pela Petrobrás em mar brasileiro.
ENTREVISTA – OTÁVIO COSTA – Segunda parte
Jornal Brasil Popular (JBP) – O jornalismo lavajatista pode ser entendido como continuidade da campanha “Mar de Lama”, contra o Getúlio Vargas e contra a criação da Petrobrás?
Otávio Costa – Essa é uma opinião do Beto Almeida e eu respeito a opinião dele, mas acho que a campanha contra Vargas, que é uma campanha de 1953/54, que levou ao suicídio de Vargas, teve militares à frente. Quer dizer, a tentativa deles, de um grupo deles que vinha da Segunda Guerra Mundial, era a de derrubar Vargas, tinha a presença de Golbery [general Golbery do Couto e Silva], Geisel [general Ernesto Beckmann Geisel] e outros conspiradores, que tentaram derrubar Getúlio, mas com o suicídio, o plano deles não foi à frente.
Na eleição de Juscelino Kubitschek (1956-1961), esse grupo também tentou impedir a posse de JK. Um deles, o brigadeiro Burnier, chefiou, ao lado do tenente-coronel Haroldo Veloso e outros oficiais da Força Aérea Brasileira, uma fracassada tentativa de golpe militar contra o governo do presidente JK, a chamada Revolta de Aragarças, em 1955. Esse brigadeiro foi, inclusive, um dos responsáveis pela tortura e morte com requintes de crueldade do estudante Stuart Edgar Angel Jones, na Base Aérea do Galeão.
JBP – Os governos Lula e Dilma formaram um momento diferente na relação entre Forças Armadas e governo democrático?
Otávio Costa – Sim. O golpismo que durou dos anos 1950 à primeira metade dos anos 1980 foi momento da história do Brasil diferente. Nos anos 1950, eles tentaram e não conseguiram. Em 1964, finalmente eles dão o golpe. É o mesmo grupo que vinha de lá de 1954. Por isso que eu digo que, a análise do jornalista Beto Almeida sobre as semelhanças entre o chamado “mar de lama” e o lavajatismo tem toda razão. Mas aí se tem a volta da democracia depois de 21 anos de ditadura militar. Nesse período, os militares estavam lá no canto deles. Nos governos Lula e Dilma, o Brasil teve vários ministros da Defesa, dentre eles, Aldo Rebelo, ligado ao PCdoB [um dos partidos políticos mais perseguidos pela ditadura militar na chamada Guerrilha do Araguai]. E os militares, calados. Embora Jair Bolsonaro já falasse bobagens no Congresso Nacional.
Naquele momento do governo Lula/Dilma não havia essa articulação tão evidente quanto se tem hoje. Passamos pelo governo Dilma e o Brasil se deparou com a Operação Lava Jato. Acho que a Lava Jato foi um momento extremamente reacionário, conservador e com características golpistas que acaba provocando o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Acho que esse movimento lavajatista e o impeachment de Dilma é um pouco diferente daqueles movimentos lá de trás contra Vargas, JK, Jânio Quadros e contra Jango. Ali era uma geração de militares que vinham mais ou menos da 2ª Guerra Mundial. Hoje, temos outra geração de militares.
JBP – Mas o lavajatismo teve também a ingerência preponderante dos EUA e a participação de empresários, militares, religiosos, e uma ruma de golpistas brasileiros interessados em se enriquecer com o patrimônio nacional. Tudo muito parecido com 1954 e 1964.
Otávio Costa – Evidentemente que temos empresários também nesse conluio de 2016. Mas com outro perfil. Por exemplo, no golpe de 1964, a Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], financiou a Operação Bandeirantes – ou como ficou conhecida de Oban –, em 1969. Foi uma coisa terrível que unia policiais civis com oficiais do Exército criando porões para prender, torturar e matar muita gente. A Fiesp bancou isso financeiramente e, durante parte dessa operação, Delfim Netto era o intermediário. Quando se fala do golpe civil-militar de 1964, é muito em razão disso porque muitos empresários se envolveram naquela situação terrível.
Existe um caso emblemático que virou filme. É a história real do presidente da Ultragaz, um dinamarquês naturalizado brasileiro cujo nome era Henning Albert Boilesen, que pagava para assistir, pessoalmente, às sessões de tortura. Ele não só apoiou a ditadura militar, mas também a financiou. Ele tinha um desvio de humanidade. Ele pagava para assistir às sessões de tortura e morte de opositores do regime sanguinário.
O delegado Fleury, de São Paulo, era amigo dele e, quando tinha sessões de tortura, o convocava ele para assistir. Para quem não sabe, Sérgio Fernando Paranhos Fleury, ou, simplesmente, delegado Fleury, foi um policial que atuou como delegado do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) na ditadura e ficou conhecido por sua atuação violenta. Ele foi acusado de torturar e assassinar centenas de pessoas, mas morreu, em 1979, antes de ser julgado.
Henninng Boilesen, por sua vez, trouxe dos EUA um aparelho de tortura por eletrochoque que ficou conhecido como a “pianola de Boilesen”. Esse empresário morreu em 1971, mas, antes disso, inventou de tocar música clássica nas sessões de tortura. Era um alto empresário, amigo de Delfim Netto. Tem até um filme sobre isso intitulado “Cidadão Boilesen”.
JBP – Isso é uma história tenebrosa do Brasil que Jair Bolsonaro faz questão de elogiar. Mas qual a semelhança entre aquele momento, o golpe de 2016, a Lava Jato e hoje: eleições 2022?
Otávio Costa – Aquilo foi um dos momentos mais tenebrosos da história do Brasil. Foi um momento de muito sofrimento para milhares de famílias brasileiras. Não estamos comparando a essa situação. De qualquer forma, nesta ditadura atual tem muita gente sofrendo, como a população indígena, os sem-terra, milhões de pessoas passando fome, desempregada etc. Mas não é igual ao golpe de 1964. Este momento agora é golpista no sentido de desrespeitar as decisões do povo, porque foi o povo que elegeu Dilma Rousseff e Lula, e as elites escravagistas armaram toda uma circunstância, primeiramente, para retirar Lula do páreo eleitoral de 2018, desde cedo. Quer dizer, eles foram minando o Lula até impedi-lo de participar da eleição de 2018 e, a Dilma, antes de 2016, perde o mandato também em razão dessa conspiração midiática, com a grande imprensa apoiando. A grande imprensa, ou a denominada imprensa neoliberal, apoiou a Lava Jato, a prisão de Lula, o impeachment de Dilma e a apoio a decisão dos golpistas de Lula não concorrer à eleição de 2018.
JBP – O senhor disse que durante os governos Lula e Dilma as elites golpistas das Forças Armadas estavam quietas, mas, nas eleições de 2018 houve uma participação decisiva do Exército para impedir a candidatura de Lula.
Otávio Costa – Sim. Foi na famosa reunião do Supremo Tribunal Federal (STF). Nessa reunião, que o Supremo impediu o Lula de participar da eleição, mesmo o Lula não tendo sido condenado em Segunda Instância, houve um episódio que definiu isso. Na véspera, o general Eduardo Villas Bôas, que era o comandante do Exército, pressionou o STF dizendo que ia virar a mesa se eles permitissem que o Lula participasse da eleição de 2018.
Isso aconteceu na véspera do julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula. Villas Bôas usou até as redes digitais para pressionar o STF e afirmou que “o Exército brasileiro compartilha o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”.
JBP – Então podemos dizer que o “lavajtismo” é uma continuidade do golpismo do “mar de lama”?
Otávio Costa – Olha, há sim uma conspiração de militares no Brasil, como houve em 1954, em 1956 e em 1964. Mas é óbvio que, agora, é uma conspiração com outros personagens. É diferente. Nos anos 1950 e 1960, os personagens eram os mesmos: tanto os militares como os empresários. Hoje são outros nomes e outra gente. Podemos ver, inclusive, esses generais que estão apoiando as loucuras desse cidadão que está sentado no Palácio do Planalto, desse inominável. Tem muita gente que não fala mais o nome dele, prefere não falar o nome dele porque é uma coisa sombria para o País ter um homem desse nível ocupando a nossa Presidência da República. E com essas idéias.
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Confira, nesta quarta-feira (25), a terceira parte da entrevista exclusiva do presidente da ABI, Otávio Costa, ao Jornal Brasil Popular.
(*) Por Carla Lisboa com edição de Edneide Arruda
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