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“Filhas de lavadeiras” é uma forma de lavar a alma das mulheres negras

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Ganhador de vários prêmios relevantes no cinema brasileiro, o documentário brasiliense “Filhas de lavadeiras” é um desses filmes que emocionam e enchem os olhos de quem vê. Não à toa venceu em 2020 o “É Tudo Verdade”, maior festival de documentários da América Latina.

 

 

Financiado com R$ 120 mil pelo Fundo de Cultura do Distrito Federal (FAC-DF), Filhas de lavadeiras foi inspirado no livro de mesmo nome de Maria Helena Vargas, lançado em 2002. As obras retratam as filhas de lavadeiras que romperam a predestinação de suas mães, avós, bisavós, tataravós de serem lavadeiras. Tradição profissional que vem desde a escravidão.

 

 

Carybé. Tela: Jogo da vida
Carybé. Lavadeiras

 

 

Lançado em 2019, Filhas de lavadeiras vem, desde então, recebendo várias premiações. A última foi no final do ano passado, quando o curta-metragem venceu o 20º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, promovido anualmente pela Academia Brasileira de Cinema e Artes Audiovisuais (ABCAA).

 

 

A documentarista e historiadora Edileuza Penha de Souza, que foi filha de lavadeira e hoje é doutora e dirigiu o filme, conversou com o Jornal Brasil Popular. Na entrevista ela criticou a política federal de desmonte da produção cultural brasileira, falou sobre a importância de incentivos financeiros para o setor e como foi fazer o curta-metragem. “O filme Filhas de lavadeiras tem esse lugar, de lavar a alma das mulheres negras”, disse.

 

Johann Moritz Rugendas

 

 

Jornal Brasil Popular (JBP) – O curta metragem “Filhas de lavadeiras” foi dirigido e produzido por mulheres. As protagonistas são mulheres. O documentário é um filme para mulheres?

 

 

Edileuza – Não é um documentário feito exclusivamente para mulheres. É um filme para todos. É claro que as mulheres se identificam bastante com o filme, especialmente as mulheres negras, que têm uma identidade muito grande com o filme. A importância de dirigirmos filmes protagonizados por mulheres negras com histórias de superação e afeto é primordial pra se pensar o cinema brasileiro, que é um lugar marcado por estereótipos e preconceito. Então, essa produção vem no sentido de romper com isso.

 

 

JBP – Sob a luz poética das lentes do filme, o documentário retrata a vida nada fácil de mulheres negras lavadeiras. Ao mesmo tempo, lança centelhas de esperança em muitas mulheres negras jovens. Você mesma poderia continuar essa predestinação de mulheres lavadeiras, mas se superou. Então, como foi pra você fazer esse filme?

 

 

Edileuza – A gente sabe o quanto que a cultura é revolucionária. O quanto que através de um filme uma pessoa pode sonhar e mudar a sua história. Nesse sentido, a importância desse filme é esse lugar, de mostrar que nós podemos, que uma mulher negra, periférica, pode chegar a universidade pública e fazer um filme de excelência. E fazer esse filme foi de certa maneira tranquilo, porque havia dinheiro para isso. Nós gravamos em Brasília e no Rio de Janeiro e tivemos que deslocar com uma equipe inteira e isso só é possível com apoio financeiro. Por isso a importância dos Fundos de Cultura, do quanto é necessário o financiamento público para a produção audiovisual e promoção da cultura brasileira.

 

 

JBP – O documentário mostra que foram necessárias várias gerações para se romper a predestinação herdada de uma profissão escravocrata, quando só então netas ou bisnetas de lavadeiras conseguiram ingressar na universidade. Numa perspectiva cronológica, é possível dizer que o Brasil está mudando?

 

 

Edileuza – A gente viveu momentos nesse País de muitas mudanças. Os governos do presidente Lula e Dilma mostraram que era possível acabar com a pobreza, fazer com que os pobres tivessem acesso a universidade. Entretanto, a gente está vivendo um momento muito obscuro. Isso desde o governo Temer. E principalmente agora no governo Bolsonaro, que tem desmontado todas as políticas públicas que levamos mais de 500 anos para construir. Mas 2022 é o ano da virada. É um ano de eleição, é um ano de possibilidade concreta de termos novamente um presidente comprometido com o povo e que entende as necessidades da população, que sabe o que é fome. Foram esses compromissos que erradicaram a fome no Brasil. Mas agora o que temos são milhões de pessoas desabrigadas, milhões de pessoas em situação de rua e é óbvio que educação e saúde não são prioridade. Num país escravocrata é muito difícil para uma elite branca ver seu filho no mesmo lugar que a filha da empregada. Então, eu acredito nessa mudança, que é urgente e necessária, mas infelizmente estamos vivenciando todo esse retrocesso.

 

 

JBP – O seu doutorado foi sobre a ausência ou quase inexistência de mulheres negras como protagonistas no cinema brasileiro. Você vê perspectivas de mudanças nesse cenário?

 

 

Edileuza – O meu doutorado fala da ausência, mas, sobretudo, da presença negra no cinema. Porque eu trato do tema numa perspectiva de ancestralidade. Então, os primeiros negros letrados que aportaram na América também lutaram por educação. E pra mim só é possível pensar cinema nessa perspectiva de homens e mulheres que lutaram por essa causa. Então, se a gente pensar a Frente Negra, o Teatro Experimental do Negro e antes disso a Imprensa Negra e os movimentos que antecedem a Lei Áurea, foram movimentos que reivindicavam direitos à Educação. E essa nossa ausência é histórica, porque vivemos num país escravocrata que tem mais negros analfabetos do que havia na África do Sul, na época do Apartheid. A cada 17 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil. Isso tudo tem a ver com essa ausência de poder dos negros. Mas não tenho dúvida que cresce a cada dia o cinema negro. A Associação dos Profissionais do Áudio Visual Negro, que nasce em 2016, com cerca 20 associados, hoje tem mais de 800. Então, o cinema negro tem crescido muito e isso tem mostrado o quanto esse cinema é potente.

 

JBP – Em uma conversa numa live você atribuiu o fato de ser documentarista a Cuba. De que maneira o país caribenho te influenciou no jeito de ver o mundo e contar histórias através das lentes?

 

Edileuza – Estudei documentário em Cuba, país que tem muito a ensinar pra gente, não só de cinema. É um povo que resiste ao massacre estadunidense ao embargo, que é muito cruel. Isso vai desde equipamentos de cinema, mas também de medicamentos que não chegam a Cuba, como seringa e pinça para operação. Tudo isso é cruel. E o cinema cubano tem muito o que nos ensinar. Eles têm um festival internacional que, apesar de limitações de equipamentos, fazem um cinema grandioso. A Escola Internacional de Cine y Television de San Antônio de los Baños é uma das referências mundiais, que recebe alunos do mundo inteiro. Cuba tem muitos cineastas fantásticos e cito a Gloria Rolando, mulher negra diretora com filmes maravilhosos, de forma genial, que têm chegado ao mundo.

JBP – O filme “Filhas de lavadeiras” é uma forma simbólica de lavar a alma da mulher negra brasileira?

Edileuza – Penso que sim. A Neide Rafael, que é uma professora aqui no DF, diz que nossas mães lavaram com muita água e sabão a nossa dignidade. Então eu acho que o filme Filhas de lavadeiras tem esse lugar, de lavar a alma das mulheres negras e mostrar que eu sou, porque nós somos. Eu só sou essa mulher negra, porque sou filha de uma mulher que lutou para que eu pudesse romper com essa predestinação. Simbolicamente estamos lavando muitas almas.

 

 




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