Entrevista | Hermes Zaneti conversa com o JBP sobre o filme “O Complô”
por Redação – Jornal Brasil Popular em
Inspirado em seu livro com título homônimo, o documentário “O Complô”, lançado nesta quarta-feira (1º/3), lotou o auditório do Teatro dos Bancários, em Brasília, e transmitido pelo YouTube (confira o lançamento no final desta matéria). O filme mostra como o sistema financeiro e seus agentes políticos sequestraram a economia brasileira. O curta-metragem revela os impactos sociais da gestão da dívida pública. Em entrevista exclusiva para o Jornal Brasil Popular, o deputado federal constituinte Hermes Zaneti fala do filme, do livro e da necessidade de o tema da dívida pública se tornar assunto corriqueiro entre a população brasileira que paga a conta.
Reprodução do vídeo de lançamento do filme “O Complô”, na noite desta quarta-feira (1º/3), no Teatro dos Bancários em Brasília-DF. Hermes Zaneti em pé, falando ao público
“As pessoas não têm consciência de que são elas que pagam a conta. Isso é o resultado desse violento derrame que a mídia faz sobre a população, escondendo de toda a sorte de que é o povo que paga a conta da dívida pública. Metade do Orçamento da União é dedicada a juros e encargos da dívida pública. No entanto, quando a gente vê as televisões, rádios e a imprensa nacional falar sobre o Orçamento da União, a gente vê que eles dizem tantos por cento para a educação, tantos para a saúde, tantos para aquilo, tanto para a Previdência, especialmente, mas nunca dizem quanto é destinado para o pagamento da dívida pública. Há um complô nesse sentido de que ao povo tem negado o direito de saber o que é dívida pública e, em especialmente, que é ele que está pagando”, afirma ao JBP.
Dirigido pelo cineasta Luiz Alberto Cassol, o documentário “O Complô’ apresenta os bastidores da gestão da dívida pública federal, com um resgate histórico do tema desde a Assembleia Nacional Constituinte, e joga luz nos seus impactos sobre o cotidiano da população brasileira. Mostra como atores econômicos e políticos se organizam, atuam e se fazem representar nas esferas política, jurídica, econômica e de comunicação, e se valendo de todo tipo de trama política, jurídica e midiática, até mesmo durante a Assembleia Nacional Constituinte, se apropria e conduz a formulação e a gestão da política econômica, especialmente das finanças públicas, e interfere, tenta dirigir e até boicotar, nossos sonhos, escolhas e projetos políticos para o país.
“O filme é necessário porque nos ajuda a entender como essa máquina pública funciona a favor dos rentistas e como nós podemos, enquanto sociedade, nos unir para reverter a situação”, declara Cassol. “Todos os que estão envolvidos nessa denúncia têm muita coragem. A nossa esperança é de que a mensagem do filme seja levada para o povo brasileiro, e que isso nos ajude a libertar o Brasil do sistema rentista do qual somos escravos”, complementa Zaneti.
Com produção da Filmes de Junho associada com a Abravídeo, o curta-metragem conta com narração da atriz Manuela do Monte e atuação do próprio Hermes Zaneti. ‘O Complô’ têm recursos de acessibilidade como Audiodescrição, Libras e Legendagem para surdos e ensurdecidos (LSE) para que qualquer pessoa com deficiência visual ou auditiva possa assistir.
O filme foi viabilizado com recursos de dezenas de entidades do movimento social organizado e pessoas físicas, a partir de campanha de financiamento coletivo. Após a sessão, será realizado um debate com as presenças de Hermes Zaneti, do Deputado Constituinte/1988; Luiz Alberto Cassol, Diretor do filme, Roseli Faria (Analista de Planejamento e Orçamento) e convidados. Confira, a seguir, a entrevista com o deputado Hermes Zaneti e, ao final da entrevista, clique no link para assistir o filme.
ENTREVISTA HERMES ZANETI
JBP – A discussão sobre a gestão da dívida pública é um dos temas interditados na sociedade brasileira. Por quê?
Hermes Zaneti – Quando lancei o livro “O Complô” na Feira do Livro de Porto Alegre, o professor da Universidade de Brasília, Moisés Balestro, fez uma excelente resenha sob o título “O Complô” e o fio de Ariadne do labirinto da dívida pública. A Zero Hora de Porto Alegre publicou na íntegra essa resenha, mudando apenas o título: “Um tabu chamado dívida pública”. Se você fizer uma enquete perguntando às pessoas o que é a dívida pública, elas lhe dirão, como têm dito para mim com toda freqüência, ‘é um problema do governo federal’.
As pessoas não têm consciência de que são elas que pagam a conta. Isso é o resultado desse violento derrame que a mídia faz sobre a população, absolutamente, escondendo de toda a sorte de que é o povo que paga a conta da dívida pública. Praticamente a metade do Orçamento da União é dedicada a juros e encargos da dívida pública. No entanto, quando a gente vê as televisões, rádios e a imprensa nacional falar sobre o Orçamento da União, a gente vê que eles dizem tantos por cento para a educação, tantos para a saúde, tantos para aquilo, tanto para a Previdência, especialmente, mas nunca dizem quanto é destinado para o pagamento da dívida pública.
Há um complô também nesse sentido de que ao povo tem negado o direito de saber o que é dívida pública e, em especialmente, que é ele que está pagando.
O senhor acha que o tema da dívida pública emplaca num filme?
Hermes Zaneti – Nós fizemos o documentário “O Complô” exatamente para levar essa discussão para ser compreendida, para ser conscientizado, esse problema, junto à opinião pública brasileira. Como eu disse na pergunta anterior, porque é o povo que paga essa conta e é o mais elementar direito na democracia é o direito à informação. Ainda mais o direito à informação de quem está pagando a conta. Sabemos da dificuldade. Sabemos que é preciso que este assunto seja levado às escolas como tema para crianças, dos jovens, dos adultos, das universidades, dos sindicatos, das associações para que essa discussão tome conta da opinião pública brasileira e que, por meio desse movimento de conscientização de que as pessoas pagam essa conta, elas saibam que elas estão pagando essa conta. Isto será o grande desafio. Da nossa parte, sabemos que esta é uma grande contribuição para esta conscientização. Não temos a ilusão da dificuldade, mas sabemos que é necessário que seja feito.
Como o sr. explica num filme que o pagamento dos juros sobre o estoque da dívida enriquece os agentes financeiros e as elites, além de colaborar com a precarização da oferta e qualidade dos serviços públicos?
Hermes Zaneti – Uma das questões que trato no livro é a do Artigo 166, Parágrafo 3º, Item 2, Letra b, acerca do “serviço da dívida”. Este serviço da dívida é colocado como prioridade absoluta entre as despesas do governo. Portanto, primeiro é o pagamento de juros e encargos da dívida pública. Depois se sobrar dinheiro, paga-se saúde, educação, transporte, segurança, Previdência, assistência social, geração de emprego e renda, habitação, e todos os demais direitos sociais e fundamentais, aquilo tudo que se traduz, nos tributos, como qualidade de vida para o povo. Especificamente, por que a dívida pública é um dos grande sugadores da economia nacional e um veículo de enriquecimento fantástico para os rentistas, é porque, no Brasil, temos os juros mais altos do mundo.
O juro real, no Brasil, ou seja, descontada a inflação, é cerca de 8%. Nos demais países, por exemplo, nos EUA, sempre o juro é muito menor do que a inflação. Isso ocorre também no Japão, no banco central europeu, na Alemanha, etc. Ou seja, o governo cobra para guardar o dinheiro dos que têm dinheiro de sobra, que é um dinheiro que as pessoas têm para investir na renda. Muito bem. No Brasil como o juro é muito superior à inflação, ocorre o contrário: o juro passa a ser um encargo do governo, portanto, do povo, pago aos rentistas.
O que é o rentismo?
Hermes Zaneti – O rentismo é quando o dinheiro serve para produzir dinheiro e não para a produção. Portanto, tendo presente que R$ 600 bilhões, por exemplo, no ano passado, isso dito pelo próprio presidente Lula, dito também pelas estatísticas, imagine o que seria aplicado isso em educação, saúde, transporte, habitação, Previdência, assistência social, apoio à reindustrialização do País, na geração de emprego e renda para o povo, na habitação popular. Isso tudo mostra como o rentismo suga da economia e explora o povo brasileiro.
O filme é inspirado no livro do senhor. Qual a relação artística do filme com o ex-deputado constituinte e de um partido político que não é do campo da esquerda?
Hermes Zaneti – O meu livro mostra um complô. O que é um complô? O complô é governo federal no sentido do Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público Federal fazendo um complô no sentido de traírem os interesses de quem os mantém que é o povo brasileiro. O filme é um documentário. Não tem o objetivo do entretenimento, mas da conscientização. É um trabalho que pretende despertar a consciência do povo que está sendo vítima deste complô.
Hoje sou filiado ao PSB – Partido Socialista Brasileiro. Na época, fui eleito pelo PMDB e o PMDB elegeu a maioria absoluta dos constituintes e 23 dos 24 governadores, em 1986. Então era de supor que o partido fizesse o grande enfrentamento à dívida externa da época, que era a grande dívida, no sentido de que o Brasil sendo vítima da administração externa, porque o FMI era quem mandava no Brasil, o partido, portanto, que havia tido, na dívida externa, o seu grande mote de campanha fizesse esse enfrentamento. Não houve isso. Durante a Constituinte, propus auditoria da dívida e a suspensão do seu pagamento e contei com o apoio da maioria absoluta dos constituintes. Houve uma trama liderada por Carlos Santana, liderada por José Sarney, na Constituinte, evitando que se aprovasse o meu Projeto de Decisão Constitucional nº 1, que visava exatamente isso.
Mas constituímos depois esse mesmo movimento e aprovamos o Artigo 26 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que garantiu, na Constituição, o dever do Congresso Nacional realizar essa auditoria. Essa auditoria em sua dimensão real nunca foi feita. Por um lado, houve uma ação do Supremo Tribunal Federal, desde 2004, que foi julgava, em setembro de 2022, decidiu o Supremo que aquela ordem não constava da Constituição, embora fizesse parte do Artigo 26 do ADCT. Há, portanto, um complô, eu repito, dos grandes poderes da União contra o povo. As instituições votam contra as mantém. Por outro lado, a dívida pública não é uma questão de sentido ideológico de esquerda ou de direita. É uma questão da Nação brasileira. Essa dívida pública esmaga o povo brasileiro, independentemente de sua ideologia político-partidária, mas voltada a beneficiar uma pequena minoria calculada em 1% da população brasileira. O que se propõe neste sentido e neste primeiro momento é atingir o coração desse projeto explorador do Brasil, que é o sistema financeiro rentista.
Fale mais sobre o desejo de transformar esse tema tão espinhoso e difícil de entender e de associá-lo ao nosso dia a dia em filme. O sr. acha que com o filme irá conseguir formar consciências?
Hermes Zaneti – A nossa contribuição ao fazermos este documentário é exatamente levarmos essa discussão a nível nacional dentro das escolas, como já disse, nas escolas de primeiro, segundo e terceiro graus, nos doutorados, nos pós-doutorados. Aí o desafio para a própria intelectualidade brasileira, para a Academia, no sentido de que os juros não podem ser o referencial que ditem os rumos da economia do País, que ditem a vida do povo brasileiro. Há um teórico que evoluiu muito em seu pensamento e nos deixou muito satisfeitos porque, na verdade, ele se constitui como uma espécie de fundamento à luta que levo há mais de 35 anos, é o André Lara Resende, um dos pais do Plano Real.
Num artigo recente, ele arremata essa questão de forma definitiva e diz o seguinte, se os juros dominasse a inflação, se reduzissem a inflação, então não haveria necessidade de termos feito o Plano Real, bastava termos elevado os juros. Essa discussão precisa ser feita pelo povo, de ser introduzida nos sindicatos, nas associações. O povo precisa ter a consciência, e essa é a nossa contribuição. Não será a única e nem será exclusiva, mas pretende ser uma espécie de estopim para detonar essa discussão para que o povo tenha essa consciência e, nesse sentido, possa, numa mobilização nacional, que tem que, inclusive, chegar nas favelas. A gente está vendo o povo sem emprego, com dívidas astronômicas, as favelas dobrando o número de moradores desde 1988 até esta parte, uma vida nacional, num dos países mais ricos do mundo, em que se exporta o coração e o estômago porque o Brasil alimenta através do seu subsolo e riquezas mineiras a indústria do mundo e exporta o que falta na comida e no prato do povo brasileiro.
Isso tudo pode ser revertido. Temos tudo para sermos uma nação de um povo feliz, numa sociedade mais justa e igualitária. É necessário fazermos esse enfrentamento e esta é a nossa contribuição. Repito: na minha expectativa, fizemos o documentário com este propósito e que ele seja o estopim a detonar essa discussão nacionalmente e contribua para a formação de uma consciência crítica capaz de entender a razão fundamental pela qual esta nação vive de uma forma tão complicada, tão difícil, quando poderia ser a maior nação do mundo.
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