“Percebemos que o racismo está enraizado em nossa sociedade quando vemos expressões como ‘criado mudo’, ‘mulata’ e ‘inveja branca’ serem naturalizadas e consideradas comuns para muitas pessoas. Inclusive, nós mesmos, corremos o risco de reforçar pensamentos racistas sem nos darmos conta disso. Vigilância e atenção constantes são necessárias para não reproduzirmos termos ofensivos à população negra. ”
Jornalista Luciana Capiberibe – FJM
Desigualdades sociais e raciais ainda mais expostas
As doenças não são entidades democráticas. Pelo contrário, elas têm incidências determinadas pela renda, pela idade, pelo gênero e pela raça. Diante da pandemia provocada pelo coronavírus, diversos segmentos da sociedade estão mais expostos e são identificados como grupos de risco, por conta de comorbidades específicas.
A população negra, em sua diversidade, também é um dos grupos de risco, obviamente com gradações internas, variando tanto por obesidade que atingem negras e negros em maior número, caso da hipertensão e da diabetes e, principalmente, a anemia falciforme, ou mesmo pela letalidade social, motivada por questões históricas, políticas e sociais estruturantes de nossa sociedade.
O Racismo e Saúde, aponta que o racismo estrutural dificulta a vida de negros e negras, e não seria diferente durante a pandemia “Estamos falando de um grupo que carrega dificuldades estruturais no seu viver, provocada por um racismo estrutural e estruturante, que começa desde a informação que chega a essa população até o acesso a exames para detecção do vírus, principalmente no que chamamos de casos suspeitos”.
Se as desigualdades sociais já são relevantes para o agravamento de outras doenças, no caso da Covid-19, o cenário não é diferente. Aponta que esse debate é urgente para as ações para lidar com o coronavírus: “ É preciso abrir um debate urgente sobre o quanto as desigualdades sociais agravam ou até impedem as possibilidades de prevenção de adoecimento e morte pela Covid-19. Além da questão relacionada à moradia da população pobre no país, composta por uma maioria de negras e negros, onde provoca as dificuldades de se fazer quarentena: “Somos a maioria entre as pessoas que continuam pegando trem ou ônibus lotado para poder ir trabalhar.
A pergunta que fica é:
Como fazer a quarentena nessas condições?
Ele vai se isolar aonde?
No seu barraco de dois metros quadrados, com filhos, avós, esposa?
Como ele vai se cuidar?
É urgente que as autoridades sanitárias e as autoridades políticas em geral desenvolvam estratégia de contenção da Covid-19 nesses grupos, ou a gente vai presenciar uma carnificina sem precedentes”.
Desafios para lidar com a doença
O racismo estrutural e o Sistema de Saúde: Para além das doenças diretamente relacionadas ou que atingem em maior número a população negra, a sobrecarga que a pandemia pode causar ao sistema de saúde do país pode expor ainda mais o racismo estrutural que atravessa o atendimento da saúde. ”.
“Os movimentos sociais negros e de mulheres negras, buscam conjugar ações emergenciais e políticas que ampliem as condições sanitárias da população negra e também ações políticas de largo prazo que garantam o futuro dessa população em um país tão desigual e violento”.
Pensar como lidar com a situação na crise requer também o pensamento em formação dos profissionais e da ciência. Neste sentido, a atuação de cientistas e a formação de profissionais que lidem com tais questões sociais e raciais que fazem parte do nosso cotidiano de atendimento em saúde devem ser reforçadas ainda mais nos períodos especiais. “Cientistas negras e negros tem uma importância muito grande neste período, pois foram elas e eles que, para além dos sinais e sintomas, buscaram as causas e efeitos do racismo na saúde da população negra. A participação dos movimentos sociais negros transformou-se em mola propulsora destes estudos e políticas de atenção, medidas estas que precisam ser tomadas também no contexto do coronavírus”.
Diante deste cenário que se revela e pode aprofundar ainda mais as desigualdades raciais e sociais do país.
Como reproduzir o impacto negativo da Covid-19 para a população negra?
__________________________________________________________