Enquanto enfrenta a ação demencial de Bolsonaro, Queiroga & Cia. na sabotagem da vacinação, o Brasil fica muito à margem do que acontece fora de suas fronteiras e pouco toma conhecimento de fatos da economia mundial que agravam sua situação interna.
Na verdade o que acontece é que a combinação de ações e omissões do governo Bolsonaro agrava ainda mais a situação brasileira, originalmente resultado do modelo econômico do arrastão neoliberal em vigor na maioria dos países.
No primeiro dia do ano, alguns veículos da mídia brasileira reproduziram sem maior destaque algumas informações da imprensa internacional sobre a evolução da fortuna dos superricos do mundo ao longo de 2021.
No fim do ano, segundo essas informações, havia no mundo mais de duzentas fortunas acima de 10 bilhões de dólares e um recorde de dez fortunas acima de 100 bilhões. Só essas dez totalizam 1 trilhão e as duzentas acima de 10 bi somam mais 2 trilhões de dólares.
Segundo o Índice Bloomberg de Bilionários, o patrimônio líquido combinado dos integrantes desse índice já ultrapassa 8 trilhões, mais do que o PIB de todos os países do mundo com exceção dos Estados Unidos e da China.
Enquanto isso, de acordo com o Banco Mundial, os dois anos já decorridos desde o início da pandemia empurraram mais de 150 milhões de pessoas para a pobreza extrema. Isso é mais que a população inteira do Japão, de 125 milhões, ou do México, de 128 milhões.
São números obscenos, que mostram o agravamento crescente e incontido da concentração de renda no mundo – concentração que é ainda pior no Brasil, onde o 1% mais rico da população (cerca de 2.2 milhões de pessoas) controla praticamente a metade (49%) da riqueza nacional produzida pelos 220 milhões de habitantes do país.
Esses números têm muito a ver com a situação política do Brasil, pois Bolsonaro foi o recurso eleitoral encontrado por suas forças mais retrogradas e reacionárias, junto com a prisão de Lula, para garantir essa concentração de renda e seu incremento. O fenômeno Bolsonaro no Brasil e o fenômeno Trump nos Estados Unidos são casos extremos de uma situação histórica que parece insustentável.
A queda das cotações de Bolsonaro nas pesquisas eleitorais parece corresponder a uma recusa coletiva e crescente do modelo econômico que produz números tão obscenos e a fúria de Bolsonaro nos últimos dias pode ter a ver com mais alguma coisa além da percepção de que, como Trump, também ele vai ser derrotado na tentativa de reeleição. Bolsonaro deve ter-se dado conta igualmente de que, de novo como Trump, não vai ter apoio militar para qualquer aventura golpista.
Pior, a recente decisão do Comandante do Exército, General Paulo Sérgio, de exigir que na volta ao serviço presencial oficiais e praças estejam vacinados, foi vista até pelos públicos menos informados como sinal indireto mas indiscutível de distanciamento dos comandos militares em relação a Bolsonaro.
Pior ainda, Bolsonaro reafirmou estes dias, em seu surto de fúria, que não vai permitir a vacinação de sua filha Laura, de 11 anos, aluna do Colégio Militar de Brasília graças a uma carteirada do pai. Genérica e ampla como foi, a decisão do Comandante do Exército não tem como não se aplicar aos colégios militares e estender a eles a exigência de vacinação tanto aos professores como aos alunos.
Isso pode explicar os muitos decibéis a mais do som e fúria de Bolsonaro contra os “fanáticos” da vacina, como os chamou, envolvendo nesse xingamento não só os dirigentes da Anvisa como o próprio Comandante do Exército.
A fatia que corresponde a 1% da população mais rica do Brasil detém quase a metade da riqueza nacional (49,6%), aponta o relatório da Riqueza Global, publicado anualmente pelo banco Credit Suisse. De acordo com a análise, entre dez países selecionados, o Brasil só fica atrás da Rússia na comparação dos ganhos do topo da pirâmide em relação ao restante da população…. – Veja mais em https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/06/24/distribuicao-riqueza-nacional—brasil.htm?cmpid=copiaecola
Nova York — Mercados de ações em alta e avaliações crescentes de tudo, de mansões a criptografia e commodities, impulsionaram a fortuna coletiva das 500 pessoas mais ricas do mundo em mais de US$ 1 trilhão, mesmo com a pandemia de Covid-19 agitando o mundo pelo segundo ano.
Esses ganhos significam que há agora um recorde de 10 fortunas acima de US$ 100 bilhões, mais de 200 acima de US$ 10 bilhões e mais: Elon Musk, dono da Tesla e da SpaceX, atingiu o maior nível de riqueza, ajustado pela inflação, alcançado pela pessoa mais rica da história moderna. Jeff Bezos, ex-CEO da Amazon, e o francês Bernard Arnault, presidente e diretor executivo da LVMH, a maior empresa de artigos de luxo do mundo, estão próximos de atingir patrimônio de US$ 200 bilhões.
A pandemia empurrou cerca de 150 milhões de pessoas para a pobreza extrema, de acordo com estimativas do Banco Mundial, um número que deve aumentar se a inflação continuar a subir.
— Desde meados da década de 1990, a parcela da riqueza detida pelos mais ricos do mundo aumentou de cerca de 7% para 11%. A crise não reverteu essa tendência. Isso amplificou ligeiramente — disse Lucas Chancel, codiretor do Laboratório de Desigualdade Mundial da Escola de Economia de Paris.
O patrimônio líquido combinado no Índice Bloomberg Billionaires agora ultrapassa US$ 8,4 trilhões, mais do que o PIB de todos os países, com exceção dos Estados Unidos e China.
(*) José Augusto Ribeiro – Jornalista e escritor. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.
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