A humanidade vive tempos difíceis. A pandemia do coronavírus (Covid-19), que afeta todo o mundo, tem revelado a face oculta de governos autoritários, violentos, misóginos e negacionistas, que têm como projeto a eliminação das populações vulneráveis e, neste contexto, a população negra, especialmente, as mulheres.
Mas, eliminar a nós, mulheres negras, não será uma tarefa fácil, porque, conscientes de nossos direitos e potenciais de luta e resistência, combinamos coletivamente que não vamos deixar nos matarem. Assim, gritaremos sempre: Não Vamos Morrer! Não Queremos Morrer!
Com essa determinação, nós, mulheres aquilombadas, organizadas no Coletivo de Mulheres Negras Baobá, lutamos contra todas as violências – física, psicológica, de eliminação dos corpos –, o silenciamento, o cancelamento, o congelamento, a opressão, o veto, o desrespeito, a desvalorização e o desprezo; estas tentativas de apagamento, que afetam as mulheres, principalmente, negras, que sempre estiveram na base da pirâmide social.
Cancelamos o anonimato de mulheres negras e as colocamos em espaço de fala política. Também trouxemos mulheres negras para se juntarem à luta por direitos. Somos mulheres que encaramos rupturas não como novela das oito, mas com muita maturidade e postura.
Cientes de que vivemos um drama político real, não precisamos de palco para demonstrar algum teatro, pois somos reais na luta política pelos nossos direitos. Nossas características não foram forjadas da noite para o dia. São frutos de uma luta raiz, uma luta Baobá, que vem de longe.
Atualmente, o Coletivo de Mulheres Negras Baobá concentra suas ações na prática de uma luta política comunitária, auxiliando mulheres negras chefes de família, que estão desempregadas, sem auxílio emergencial e sem vacina, por negligência do governo. Distribuímos cestas básicas e máscaras para 26 famílias da comunidade Lúcio Costa do Guará.
Essas cestas e máscaras são oriundas de uma força tarefa de parcerias e doações das próprias Baobás. Consideramos essa distribuição uma chamada de atenção para dizer à sociedade. Tem Gente com Fome e A Fome Tem Pressa.
Na política comunitária, enquanto muitos políticos oferecem soluções momentâneas assistencialistas, nosso coletivo leva assistência social, na tentativa de formar mentes, para a emancipação política comunitária.
A distribuição de cestas básicas na comunidade Lúcio Costa do Guara nos proporcionou conhecer aquele local por intermédio de uma professora negra, preocupada com seus alunos negros. Percebemos, ali, a importância de conquistar e respeitar o espaço, saber ouvir e entender que a humanização dessas pessoas passa pela construção de uma política pública comunitária.
Determinado não apenas em manter, mas, sobretudo, em ampliar o desequilíbrio econômico e social da população, o governo negacionista tem retirado direitos mínimos, historicamente estabelecidos.
Essa violência institucionalizada, trouxe para o campo comunitário, o debate inevitável, sobre a busca de alternativas mínimas de sobrevivência. Neste contexto, são geradas as condições de organização comunitária, que desemboca em um trabalho de conscientização política das pessoas atingidas, derivando um fortalecimento pessoal em prol da coletividade.
Neste sentido, temos vários exemplos de atitudes simples para a sobrevivência individual e coletiva como a Horta Solidária, a partilha do que tem mais para quem tem menos, ou até mesmo o escambo.
Para esse coletivo, o debate político para a construção da mente emancipatória passa pela história de construção da luta social de um povo. Desta forma, nós, mulheres negras Baobá, também estamos presentes no 8M Unificadas do DF e Entorno, que neste 2021, traz o mote “Pela Vida de Todas as Mulheres! Vacina e Auxílio Emergencial Já! Fora Bolsonaro e seu Governo Assassino!”. Contribuímos com falas de construções políticas, que são importantes para a luta social e para a inclusão de representatividades, respeitando a pluralidade étnica no Brasil.
Assim, resgatamos para o movimento, mulheres negras que estavam no anonimato. Juntas neste espaço político, nos manifestamos também contra esse governo, que é genocida e que tem tentado apagar mulheres, homens, jovens, idosas/as pretas e pretos.
O extermínio foi muito bem arquitetado para eliminação dos discriminadas/os historicamente, pelo racismo institucional e estrutural. Dentre as quais, estão as mulheres negras, sempre as mais oprimidas, e alvo para o extermínio.
No debate sobre o patriarcado, enxergamos a condição feminina e a dominação masculina. Neste cenário, as mulheres, especialmente, as negras, são apresentadas como fragilizadas, e a potência feminista é negada. Assim, a cultura machista reina no cérebro de quem ainda alimenta o direito de domínio dos corpos e o poder da opressão e da covardia.
Mas, resistindo a esse pensamento construído, nos colocamos de forma insubmissas diante da posição de poder dos homens, e nos organizamos coletivamente, para enfrentar esse sistema – sociopolítico e patriarcal – brutal.
Sabemos, todavia, que não basta sermos mulheres. Temos que ser conscientes da luta política, refletindo e questionando: de onde viemos? Onde estamos? Para onde vamos? Essa prática é uma descoberta da mulher seja ela negra ou não.
Nós, mulheres negras, sintonizadas em nosso tempo, procuramos humanizar nossas relações, acumular forças e elaborar políticas para a construção de dias melhores.
(*) Por Coletivo de Mulheres Negras Baobá DF e Entorno
Confira fotos da ação do Coletivo de Mulheres Negras Baobá DF e Entorno no Lúcio Costa, bairro do Guará, no Distrito Federal: