Acabo de ler matéria publicada no Estadão, com a assinatura de Fernanda FrizzoBragato, professora do Programa de Pós-graduação em Direito – UNISINOS e de KenarikBoujikian, cofundadora da Associação Juízes para a Democracia, desembargadora aposentada TJSP, que acompanharam como membros da sociedade civil, a visita ao Brasil da subsecretária-geral das Nações Unidas e Assessora Especial para Prevenção do Genocídio Alice WairimuNderitu. No artigo suas subscritoras afirmam categoricamente, diante das conclusões e da declaração pública da autoridade das Nações Unidas, que é chegada a hora da ONU proteger os Guarani e Kaiowá, referindo-se somente ao âmbito mato-grossense do sul da visita. Para os aqui no Brasil, entre nós, que há anos acompanhamos a tragédia que a desídia e a cumplicidade com a voracidade espoliadora e opressora que afeta os territórios, a cultura e a existência dos povos indígenas, é a 25ª hora.
No artigo as autoras esclarecem que a assessora chefia um Escritório cujo mandato objetiva coletar informações sobre graves violações de direitos humanos contra grupos étnicos e raciais discriminados que, se não forem evitadas ou interrompidas, podem levar a crimes de atrocidade (genocídio, crimes contra humanidade, crimes de guerra ou limpeza étnica).
E esclarecem que tais crimes não acontecem espontaneamente e decorrem de processos que se desdobram em inúmeros atos ou omissões. Constatado o risco, o Escritório alerta o Secretário-geral da ONU, bem como a comunidade internacional, em busca de soluções. Ele oferece cooperação ao Estado e pode engajar-se com a sociedade civil em ações para prevenir, deter ou preparar a responsabilização por possíveis crimes. Ele age preventivamente na presença de fatores de risco, como discursos de ódio contra grupos vulneráveis, interesses econômicos sobre os bens que lhes são de direito, desequilíbrio de poder entre os grupos em conflito, indisposição ou incapacidade do Estado para proteger, presença de hostilidades e ocorrência de crimes.
Com efeito, na sexta-feira, dia 12/05, a sub-secretária em declaração pública, apresentou as observações preliminares da visita de 11 dias realizada no Brasil, onde esteve pela primeira vez, numa missão durante a qual ela se reuniu com altos funcionários e representantes do governo, representantes de organizações da sociedade civil e representantes de comunidades indígenas e minorias em todo o país, assim como membros da comunidade internacional.
Ela deixou claro a natureza, os objetivos e as circunstâncias da visita, esclarecendo que veio a convite do governo brasileiro, que é uma agenda convencional de monitoramento nos seus termos legais e os limites do relatório. Nos termos de sua declaração:
Esta é a minha primeira visita oficial ao Brasil, realizada de 1 a 12 de maio de 2023. Primeiramente, estendo meu agradecimento ao governo Brasileiro.
Devo ser clara sobre o principal objetivo desta visita. Estou no Brasil a convite do governo brasileiro. Isso é esperado, considerando que tenho um mandato global e visito vários outros países também. O propósito da minha visita foi realizar consultas a oficiais sêniores do governo, colegas da equipe de país das Nações Unidas, representantes da sociedade civil, líderes comunitários e outros atores relevantes sobre ampliar a proteção de povos indígenas, pessoas afro-brasileiras e outros grupos em situação de risco.
Em Brasília, tive reuniões com Ministros e oficiais sêniores dos Ministérios das Relações Exteriores, Igualdade Racial, Direitos Humanos e Cidadania, Povos Indígenas, Mulheres, Esporte, Saúde e Justiça e Segurança Pública, além da Defensoria Pública, Procuradoria Geral da República, Advocacia Geral da União, Conselho Nacional de Direitos Humanos e organizações da sociedade civil.
Também viajei para o estado de Roraima e tive reuniões com autoridades governamentais federais e estaduais, incluindo o governador AntonioDenarium e representantes dos povos indígenas e da sociedade civil em Boa Vista. Visitei o Centro de Saúde Indígena de Boa Vista (CASAI) e testemunhei de perto a situação de extrema precariedade do povo Yanomami, que há décadas sofre abusos e violações. Tive reuniões com as lideranças Yanomami e visitei outros indígenas e outras comunidades da região, que vêm recebendo apoio do governo nacional desde o início deste ano, mas continuam em situação de grande vulnerabilidade.
Também visitei o estado de Mato Grosso do Sul, inclusive o governador Eduardo Riedel, e tive reuniões com autoridades estaduais e sociedade civil em Campo Grande. Visitei a comunidade Guarani Kaiowá no território Guapo’y e outras partes do estado. Conversei com acadêmicos da Universidade de Dourados e fiz uma apresentação sobre formas de aumentar a proteção do povo Guarani Kaiowá e de outros grupos indígenas. Visitei as populações deslocadas Guarani Kaiowá e a comunidade quilombola.
No Rio de Janeiro, realizei consultas com representantes de pessoas afrodescendentes que têm enfrentado graves atos de violência, bem como funcionários do governo e representantes da sociedade civil que representam e promovem os direitos de vários grupos vulneráveis. No Rio me encontrei com o Governador Interino Thiago Pampolha e com o Procurador Regional e participei de um evento organizado pela sociedade civil.
Antes de me aprofundar em um resumo de meus achados, devo esclarecer o papel de meu mandato, o que foi explicado em todos os compromissos que tive aqui no Brasil.
Não estou aqui para caracterizar a natureza dos crimes cometidos ou determinar se o crime de genocídio foi cometido ou não no Brasil.
Somente um tribunal de justiça competente (nacional ou internacional) pode determinar se houve genocídio, crimes de guerra ou crimes contra a humanidade (crimes de atrocidade). Meu mandato é a prevenção do genocídio contra grupos nacionais, étnicos, raciais ou religiosos, comumente referidos como grupos protegidos.
Com certeza, está tudo muito claro sobre o alcance da visita e da função de monitoramento que incumbem ao mandato da representante das Nações Unidas. Ela faz o relato da situação constatada mas não lhe cabe caracterizar a natureza de crimes cometidos, mesmo que se trate de genocídio, porque essa é uma atribuição de tribunais nacionais e internacionais. Mas, convenhamos, se a descrição verdadeira da realidade a explica, nos termos do relatório, salta aos olhos a sua tipicidade. Como deve saltar aos olhos das autoridades que acompanharam a visita e o vão receber formalmente.
Basta ver as conclusões publicamente anunciadas:
Olhando para os fatores de risco para crimes de genocídio e atrocidades em relação à situação dos povos indígenas, brasileiros afrodescendentes e outros grupos de risco no Brasil, constato com preocupação que há registros de graves violações do direito internacional dos direitos humanos contra esses grupos; situações de instabilidade, principalmente no que se refere ao conflito entre indígenas e fazendeiros; uso excessivo da força pelas agências de segurança, especialmente contra pessoas negras; tensões intergrupais entre comunidades indígenas e outros grupos; e uma série de políticas que facilitaram a discriminação e o abuso desses grupos protegidos com base em sua identidade.
A presença desses fatores de risco para crimes de atrocidade exige medidas urgentes por parte das autoridades, da sociedade civil, da mídia, das Nações Unidas e de outros atores relevantes para corrigir a trajetória.
Antes de concluir, permitam-me fazer algumas recomendações para aumentar a proteção de grupos indígenas, afrodescendentes e outras comunidades em risco no Brasil:
Não é necessário desenhar. O relatório mesmo preliminar, é uma notitia criminis. Em toda a sua abrangência e em diferentes tipos. Principalmente na caracterização de genocídio e crimes de atrocidade. Para os que estamos há muito advertindo para a gravidade dessa situação, tal como aqui mesmo no espaço deste jornal (https://www.brasilpopular.com/pode-se-falar-de-crime-de-genocidio-no-quadro-de-mortandade-atual-yanomami-em-roraima/), é chegada a 25ª hora. Caracterizados os crimes, cabe as autoridades judicantes que detêm a iniciativa penal dar consequência a notitia criminis. O que farão? Agir ou omitir-se?
(*) José Geraldo de Sousa Junior é professor titular na Faculdade de Direito e ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB)
José Geraldo de Sousa Junior é graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – AEUDF, mestre e doutor em Direito pela Universidade de Brasília – UnB. É também jurista, pesquisador de temas relacionados aos direitos humanos e à cidadania, sendo reconhecido como um dos autores do projeto Direito Achado na Rua, grupo de pesquisa com mais de 45 pesquisadores envolvidos.
Professor da UnB desde 1985, ocupou postos importantes dentro e fora da Universidade. Foi chefe de gabinete e procurador jurídico na gestão do professor Cristovam Buarque; dirigiu o Departamento de Política do Ensino Superior no Ministério da Educação; é membro do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, onde acumula três décadas de atuação na defesa dos direitos civis e de mediação de conflitos sociais.
Em 2008, foi escolhido reitor, em eleição realizada com voto paritário de professores, estudantes e funcionários da UnB. É autor de, entre outros, Sociedade Democrática (Universidade de Brasília, 2007), O Direito Achado na Rua. Concepção e Prática 2015 (Lumen Juris, 2015) e Para um Debate Teórico-Conceitual e Político Sobre os Direitos Humanos (Editora D’Plácido, 2016).
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